Certo dia fui convidada para bater um papo com uma turma de faculdade. Encontrei ali jovens, adultos e não tão jovens. Eram várias idades e perfis. Alguns cumprindo o que se espera de um jovem atualmente e outros buscando um sonho ou uma vida melhor. Por todas essas diferenças, decidi que ao invés de palestrar, eu contaria histórias que vivenciei profissionalmente, falaria sobre transição de carreira, apresentaria cases de sucessos e insucessos como um estímulo para que eles participassem com perguntas.
Claro que, minha experiência com empresas familiares e estruturação de linha de sucessão, me levaram a falar um pouco sobre esse tipo de empreendimento. Talvez seja por isso que, quase no fim da conversa, um jovem rapaz me questionou: como faço para aturar o meu pai no trabalho? Ele trabalhava na empresa da família, um tipo de negócio que em nosso país corresponde a mais de 90% das empresas abertas, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Vou trazer aqui alguns pontos que basearem a minha resposta para que possamos refletir. Por que é preciso aturar o pai? Se você trabalha em uma empresa da família, faz isso por falta de opção ou com o interesse de contribuir com o negócio?
Você não precisa e nem deve aturar o seu pai. Trabalhar com qualquer familiar exige muita resiliência. Contudo, quando se trata de pai ou mãe, é ainda mais complicado, porque há uma série de expectativas sobre o futuro do filho, assim como preocupações sobre o que os outros colaboradores vão falar dessa relação. De acordo com uma pesquisa da consultoria PwC, 75% das empresas familiares no Brasil fecham após serem sucedidas pelos herdeiros, ou seja, apenas sete em cada 100 empresas chegam à terceira geração.
É por isso que, muitas vezes, existem cobranças que parecem indevidas, falta de paciência para ensinar e exigência para que o filho trabalhe mais do que qualquer um (afinal, o negócio um dia será dele!). Alguns, até ameaçam tirar o salário e até têm grande dificuldade de enxergar o filho como profissional. Por outro lado, o pai é flexível com horários, muitas vezes paga mais do que pagaria a outra pessoa no mesmo cargo, aumenta o salário baseado nas necessidades do filho ou dá de presente aquilo que demandaria alguns meses de economia. De fato, pai e mãe não demitem, não dão advertência e nem suspensão.
Se você ainda não sabe o que quer, não tenha medo ou vergonha de parar e avaliar outras possibilidades. Comece conhecendo suas habilidades e definindo com o que você gostaria de trabalhar. Escolha uma vaga para se candidatar e se submeta a uma seleção como um completo desconhecido. Se não for o escolhido, seja humilde e retome o processo, procurando novas vagas. Se for aceito, receba as instruções, regras e comportamentos da empresa. Cumpra os prazos, respeite seus líderes, busque conhecimento para se desenvolver e, quem sabe, passar da experiência.
Você não precisará aturar seu pai. Mas, lembre-se que você estará diante de um mercado de trabalho altamente competitivo, com profissionais dando o seu melhor e se atualizando constantemente. Será extremamente desafiador, mas se você souber aproveitar as oportunidades, será um caminho que te fortalecerá, dará garra, determinação e autoestima.
Agora, se você fez a escolha de trabalhar no negócio da família porque gosta e se identifica, atue nela como você atuaria em qualquer outra empresa.
Em uma pesquisa do próprio LinkedIn, de 2019, os pais ainda apareciam como as maiores influências na hora de escolher a carreira para cerca de 26% das pessoas. Então, respeite as diferenças na história de vida, esteja atento às mudanças do mercado, se posicione. Mas faça isso por vontade própria, com competências desenvolvidas e cheio de conteúdo, conhecimento e experiência para agregar. Porque trabalhar na empresa da família é diferente de estar ali por falta de opção.